segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

COMO LULA E SEU SOBRINHO TRANSFORMARAM OBRAS EM ANGOLA NUM ESQUEMA CRIMINOSO PELO BNDES

LULA


Há cerca de um ano e três meses, a Justiça Federal do Distrito Federal aceitou denúncia do Ministério Público Federal e transformou em réus o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o empresário Marcelo Odebrecht, Taiguara Rodrigues – sobrinho do petista –, e mais oito pessoas por um suposto esquema de desvios envolvendo a empreiteira e liberação de verbas do BNDES para obras em Angola. Aos acusados são imputados os crimes de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, tráfico de influência e organização criminosa.

Segundo o Ministério Público, os delitos ocorreram entre 2008 e 2015 e tiveram a atuação de Lula junto ao BNDES e outros órgãos federais para garantir a liberação de financiamentos pelo banco público para a realização de obras de engenharia no exterior, especialmente em Angola. A execução das construções ficou a cargo da Odebrecht, que – em retribuição – repassou aos envolvidos quantia equivalente R$ 30 milhões.


A denúncia surge a partir de provas coletadas na Operação Janus, realizada em maio de 2016, além de depoimentos. O MPF afirma que conjunto das evidências e dos fatos relatados por testemunhas não deixa dúvidas sobre a participação do ex-presidente e dos demais envolvidos no esquema. Entre os elementos comprobatórios, foram juntados ao processo documentos como: e-mails trocados entre os envolvidos e fotos que registraram encontro do ex-presidente com o sobrinho e empresários em Angola. O Ministério Público também entregou à justiça registros de uma reunião da Diretoria de Administração do BNDES em 2010, com participação de Lula, na qual o banco decidiu “que elaboraria uma agenda de ações para o período de 2011 a 2014”.

SEGUNDO O SITE SPOTNIKS “Ao findar o mandato de presidente da República em dezembro de 2010, Lula deixou criadas as bases institucionais, no âmbito do BNDES, para que tivesse continuidade, nos anos seguintes, o esquema de favorecimento, mediante financiamentos internacionais, a empresas ‘escolhidas’ para exportação de serviços a países da África e América Latina”, afirma a representação.

Na ação, o MPF afirma que, ainda no início do esquema, foram cooptados empresários e funcionários da Exergia Portugal. Com a promessa de subcontratações, a empresa lusitana concedeu a Taiguara, “de maneira praticamente gratuita”, uma filial no Brasil. Além disso, passou a bancá-lo, antes mesmo que fosse contratado no processo de terceirização promovido pela Odebrecht. Nesse período, o sobrinho do ex-presidente recebeu, segundo as investigações, R$ 699 mil a título de despesas de viagens internacionais. Posteriormente, o repasse passou a ter o caráter de “pro labore”, cujo valor era de US$15 mil mensais, totalizando ao menos US$ 255 mil dólares.

Pela atuar em favor da empreiteira, o ex-presidente teria aceitado, além da remuneração pelas palestras, outras vantagens indiretas, como pagamentos de despesas pessoais de seu irmão José Ferreira da Silva. A ação menciona gastos de pelo menos R$ 10 mil com plano de saúde e outros R$ 10 mil em combustíveis. Saques totalizando mais de R$ 1 milhão em dinheiro realizados pelos funcionários da Exergia Brasil são indícios de que os envolvidos queriam ocultar a movimentação do dinheiro. A mesma manobra foi encontrada na T7Quatro, outra companhia de Taiguara, onde mais de R$ 160 mil foram retirados em papel-moeda.

Os procuradores também apontaram que parte dos pagamentos de propina se concretizou por meio de palestras supostamente ministradas pelo ex-presidente a convite da construtora. Embora os recursos recebidos a título de palestras proferidas no exterior estivessem formalmente justificados, o MPF passou a suspeitar que os contratos escondiam o real motivo da transferência de recursos da Odebrecht para o ex-presidente.

O advogado do ex-presidente, Cristiano Zanin Martins, classificou as acusações como “absurdas e sem provas”.

“Lula é acusado pelo MPF de ter influenciado a concessão de linhas de crédito de R$ 7 bilhões para a Odebrecht e ter recebido, em contrapartida, um plano de saúde para seu irmão e a remuneração por duas palestras que ele comprovadamente fez – em valores que são iguais aos contratos relativos às demais palestras feitas pelo ex-Presidente a 41 grupos empresariais. Lula jamais interferiu na concessão de qualquer financiamento do BNDES. Como é público e notório, as decisões tomadas por aquele banco são colegiadas e baseadas no trabalho técnico de um corpo qualificado de funcionários.” – Cristiano Zanin Martins, advogado de Lula.

De acordo com a denúncia, enquanto ocupava o Planalto, Lula praticou corrupção passiva. Fora do exercício do cargo, entre 2011 e 2015, o ex-presidente teria cometido tráfico de influência em benefício dos envolvidos. Além disso, os investigadores da Procuradoria da República no DF acusam o petista de haver lavado dinheiro 44 vezes por meio de pagamentos justificados pela subcontratação da empresa Exergia Brasil, criada por Taiguara em 2009.

A suspeita sobre o sobrinho do ex-mandatário foi levantada pelo fato de sua empresa ter firmado 17 acordos para prestar serviços complexos à Odebrecht, justamente nas obras realizadas em Angola a partir de 2011, mesmo sem qualquer experiência prévia no ramo de engenharia e tendo apenas completado o ensino médio. Pelos contratos, a empresa de Taiguara recebeu da Odebrecht, entre 2009 e 2015, R$ 20 milhões. A companhia nunca mais prestou serviços a nenhum cliente: todo o faturamento veio da construtora baiana.

Para os investigadores, Lula concordou com a criação da Exergia, supervisionou e aconselhou Taiguara na captação de contratos junto à Odebrecht. A conclusão é corroborada por mensagens de celular e e-mails encontrados no celular e notebook do sobrinho. Em algumas conversas, o jovem expressa muita emoção por conseguir fácil acesso ao tio e demonstra gratidão ao segurança do ex-presidente, responsável por intermediar os contatos.

Em 2010, o petista apresentou seu sobrinho a empresários e autoridades estrangeiras em Angola. Naquele ano, o BNDES aprovou oito empréstimos para a Odebrecht que, juntos, somaram US$ 350 milhões. As concessões continuaram nos anos seguintes, quando a empresa firmou outros 22 contratos que chegaram a US$ 2 bilhões. O petista, por sua vez, afirmou que não tinha conhecimento dos negócios do sobrinho e que a denúncia não possui “qualquer elemento que possa mostrar de forma real e concreta” a sua atuação. Reportagem recente do Estadãodemonstra que os arriscados empréstimos estão com altíssimo risco de calote, que será coberto pelo Tesouro Nacional.

Antes de seus negócios em Angola, Taiguara vivia em situação econômica difícil, em apartamento simples e sem luxos, segundo seu depoimento à CPI do BNDES. Depois da entrada da Odebrecht em sua vida, passou a morar em uma cobertura duplex em Santos (SP) e adquiriu um veículo Land Rover avaliado em R$ 200 mil. Para o MPF, é óbvio que o súbito enriquecimento do empresário é inexplicável.

Essas são algumas das obras que o esquema ajudou a construir:
Projeto “Vias De Luanda”


O projeto “Vias de Luanda”, iniciado em abril de 2008 pela Odebrecht, revitalizou 36 quilômetros de vias na capital angolana. Fazem parte do pacote: trabalhos de pavimentação, instalação de calçadas, jardins, valas para drenagem, sinalização e redes subterrâneas (esgoto, água, energia elétrica e telefonia). Avenidas e praças foram revitalizadas com paisagismo, calçadas, quadras esportivas e caramanchões; o projeto foi assinado pelo escritório do arquiteto brasileiro Jaime Lerner, ex-governador do Paraná.




Visando a entrega das obras, a Odebrecht contratou a Exergia para a elaboração de sistemas de gestão da qualidade, planejamento e análise do projeto. O problema é que as atividades definidas em contrato exigiam a designação de um engenheiro experiente para realização dos trabalhos. No entanto, Taiguara achou suficiente a boa vontade de um engenheiro recém-formado. Com isso, o Ministério Público identificou um superfaturamento de US$ 1,4 milhão de dólares.
Praça Da Paz Em Luena


Construída para celebrar a memória dos acordos de paz de Luena, que colocaram fim à guerra civil em Angola, a praça foi inaugurada em 2012. Além de uma escultura representando a paz do povo angolano, o Monumento possui um jardim adjacente.

Apenas 24 dias antes da inauguração das obras, a Odebrecht novamente requisitou os serviços da Exergia para “fiscalização” dos trabalhos e revisão dos projetos. O problema apontado pelo MPF é que o prazo estimado da obra era de um ano, o que revela, segundo a investigação uma inconsistência e um superfaturamento de US$ 100 mil.
Programa De Realojamento Das Populações – Bairro Zango


Outro dos projetos da Odebrecht em Angola é o Programa de Realojamento das Populações, que consiste na construção de moradias populares destinadas prioritariamente a habitantes em situação de vulnerabilidade e risco. No Zango, bairro de Luanda, a empreiteira foi contratada para a construção de 3 mil casas populares.

Para executar a obra, a construtora requisitou consultoria técnica da Exergia para revisar os projetos e implementar de processos de melhoria da qualidade e da tecnologia construtiva das habitações. No entanto, os peritos avaliaram que o próprio corpo técnico da Odebrecht tinha essa capacidade, o que foi inclusive admitido pela empresa. A empreiteira afirmou que o contrato, apesar de assinado não teria sido efetivado. Não é o que dizem as provas: na própria documentação do acordo foram encontrados dados que indicaram que serviços foram medidos e efetivamente pagos. Nessa brincadeira, lá se foram US$ 586,8 mil superfaturados por Taiguara.
Rodovia Catata-Lóvua


A reabilitação da Estrada Nacional 225, conhecida como Catata-Lóvua, foi anunciada em 2011, quando se encontrava praticamente intransitável, devido à destruição de 11 pontes durante a guerra civil. A Odebrecht foi a responsável pelos trabalhos, que estão sendo concluídos pela construtora angolana Griner.


Neste empreendimento, a Exergia teria sido contratada para elaborar o projeto de 101 quilômetros de estradas. Em uma barbeiragem administrativa, as empresas assinaram três contratos com objetos sobrepostos para a mesma obra. Ou seja: os dois primeiros termos não tinham nem como serem executados. Pior ainda: o único contrato viável se tornou impossível um dia depois de ser assinado, já que a Exergia assinou um novo acordo de prestação de serviços de consultoria para revisar o projeto da estrada que ela mesma elaboraria.

E tem mais: consta no contrato original da Odebrecht com o órgão do governo de Angola que o projeto executivo da rodovia já estava disponível antes dos citados contratos com a Exergia de elaboração de projeto executivo. Resumo da patacoada: US$ 392.958,75 superfaturados.
Hidrelétrica De Laúca


A Hidrelétrica de Laúca, a 280 km de Luanda, foi idealizada para se tornar a maior de Angola. A usina é o passaporte angolano para a autossuficiência energética: serão 2.070 megawatts, levando energia para oito milhões de angolanos. Construída pela Odebrecht, o complexo foi inaugurado no ano passado, em agosto, com custo estimado em 4,3 bilhões de dólares.

A falta de capacidade técnico-operacional da Exergia ficou clara quando peritos examinaram os documentos da campanha de sondagens para aproveitamento hidrelétrico do Rio Laúca. No projeto, a Odebrecht optou por contratar a firma de Taiguara sem nenhum tipo de processo seletivo interno, apesar de sua natureza especializada. Na sequência, diversos relatos em e-mails demonstram que os serviços prestados pela Exergia eram de baixa qualidade e até imprestáveis, conforme exposto por empregados e consultores da empreiteira baiana.

Apenas pelos contratos referentes à hidrelétrica de Laúca, Taiguara embolsou R$ 1,8 milhão.
Hidrelétrica De Cambambe


Cambambe foi a primeira grande Central Hidrelétrica construída em Angola, no final da década de 50 e conta com quatro turbinas tipo Francis com 65 MW, totalizando 260 MW de potência instalada. O governo angolano contou com a Odebrecht para reformar e ampliar a segunda maior hidrelétrica do país, com financiamento de US$ 464 milhões do BNDES.

A maior empreiteira do Brasil foi responsável pela reabilitação da Central 1 e executa ainda a construção da Central 2, com 700 MW, que irá permitir o aproveitamento pleno do Rio Kwanza no local.

Reconhecida como complexa pela própria construtora, a obra teve apoio de Taiguara, em contratos que totalizaram R$ 3,5 milhões. Um dos serviços encomendados foi a prospecção geológica e geotécnica para construção de ponte de serviço e acessos a jusante da barragem, mas o MPF identificou que a Exergia não apresenta nenhuma documentação técnica que comprove a sua experiência com esse tipo de trabalho.

Em outro documento, a firma do sobrinho aparece como contratada para a estabilização e tratamento de taludes e encostas, mas cai no mesmo problema: nunca executou um serviço dessa complexidade antes. De acordo com o MPF, a Odebrecht não contrataria uma firma sem nenhuma experiência com a obra.

Também em Cambembe, a Exergia é contratada para prestar serviços de perfuração de maciço para a ampliação da usina. Porém, em imagens da própria Odebrecht, os procuradores identificaram que a perfuração de rocha exigiu mais de um equipamento e os operários aparecem vestindo o uniforme da construtora baiana. “Desta forma, é possível inferir que execução dos serviços não foram executados em sua totalidade com a Exergia ou então foram executados por outrem”, afirma o MPF.

A íntegra da denúncia do Ministério Público Federal pode ser acessada neste link.

A tramitação do processo contra Lula na Justiça Federal do DF pode ser acessada aqui.

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