"Sou de Recife, fui criada num colégio de freiras. Com 18 anos vim pra Natal, meu pai alugou um canto pra eu morar até eu terminar minha faculdade. Eu era orgulhosa, arrogante e sempre me achei melhor do que os outros. Tinha raiva quando chegava aquelas pessoas pedindo esmola, pedia logo pra sair de perto. E quando via um usuário de drogas na rua, já mudava o caminho.
Quantas vezes falei 'sai pra lá vagabundo, vai procurar o que fazer'. Me formei em enfermagem, comecei a trabalhar numa das melhores clínicas da época. Conheci o amor da minha da vida e tudo estava incrível. Foi quando a pior coisa me aconteceu: conheci o crack. A gente sempre acha que o que aconteceu com os outros não acontece conosco, olhamos para o outro com indiferença, pensamos ser os melhores e que nada de mal pode nos acontecer.
Comecei a chegar atrasada na clínica, depois a faltar... Algum tempo depois eles perceberam e fui demitida. Não contei para o meu pai, todo dinheiro que ele me mandava era para sustentar o vício, chegou uma hora que não consegui mais pagar o aluguel. Fui despejada. Logo minha família descobriu, meu pai até tentou me ajudar, mas eu não queria voltar pra Recife, ele parou de mandar dinheiro e algum tempo depois desistiu de mim.
Éramos eu e meu amor, viciados e sem teto. Fomos morar na rua mesmo. Passamos por vários lugares, essa 'doença no meu sangue' me consome dia após dia. Passamos muita fome e até frio. Já vi muitos morrerem nesses anos de rua, mas também salvei a vida de tantos, quantas vezes já entrei na briga deles, vendo a hora levar uma facada. Mas isso tudo é pra eu pagar minha língua, para aprender a nunca desprezar meu próximo.
Eu pesava 100 kg, hoje estou com 50 kg. Não desejo essa doença pra ninguém, espero que um dia Deus me tire dessa situação, que eu possa largar esse vício que me corrói e que destruiu toda minha vida. A oportunidade vai aparecer. Me chamo Jéssica Valdenice." Sonho: Ter uma casa pra passar o resto da vida com meu marido. Desejo: Lona pra cobrir o barraco que ela mora, cesta básica e ração pra cachorra Aurora.
Instagram: @RN invisível
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